terça-feira, 24 de junho de 2014

Quadros

                         
 

 Se eu pudesse ver a alma das pessoas ao olhar para elas, poderia ultrapassar as barreiras que me impedem de uma aproximação. Se fosse capaz de ler seus pensamentos, sentir suas emoções, sonhar seus sonhos e ouvir suas vozes interiores, poderia enxergar além de suas imagens que são ilusórias até para elas mesmas. Eu sairia da superfície de suas aparências e mergulharia na profundidade de suas essências. Eu as daria a mão e andaria junto delas. Eu entenderia as suas inseguranças e descartaria os julgamentos e condenações, assim como as desconfianças, dando lugar ao acolhimento e compaixão. Eu veria os seus erros e arrependimentos e diria que está tudo bem agora. Eu seria mais humana. Eu prestaria mais atenção nas suas palavras e gestos e daria mais valor à eles. Mas infelizmente as pessoas são superfícies quase que inalcançáveis. Elas caminham sozinhas com os seus anseios e não estão preparadas para mostrar de verdade quem são e o que querem. As pessoas são como quadros que foram pintados pelo melhor de todos os pintores, mas podem apenas ser contemplados de fora. O tempo passa e quanto mais o quadro perde a sua cor e vitalidade, menos queremos contempla-lo. Alguns quadros têm manchas imperceptíveis e outros, manchas tão grandes, que não se vê mais o quadro, somente as suas manchas. E se for para ser um quadro, prefiro ser o que fica na sala, assim todos poderão me ver e eu também poderei vê-los. Então, ao invés da solidão de um quadro estarei na confraternização de uma sala de estar. Posso ser aquele quadro antigo, carregado de recordações ou o novo que ficou em seu lugar. Não quero ser o quadro empoeirado que foi deixado no porão, porque já está velho demais para ser visto, nem tão pouco aquele que não tem significado e serve apenas para enfeite. Quero ser o que faz reviver as emoções já vividas. Desejo ser o retrato da história de alguém. Afinal, se fosse possível pintar o quadro de sua vida, você saberia pinta-lo ou seria necessário que alguém o fizesse? Você contempla demais os outros quadros e se esquece do seu? Você está na sala ou no porão agora? Você tem deixado alguém no porão? Você traz boas ou más lembranças consigo? Quem traçou as linhas que te formaram? Onde está o seu valor? Tais perguntas e suas respostas te tornam muito mais que um simples quadro, elas te diferenciam de qualquer outro quadro, elas te fazem ser uma obra única em seu valor e exclusiva em suas particularidades. Portanto, limpe a poeira, saia do porão quantas vezes forem necessárias , se possível, tire alguém de lá e se conseguir isso convide-o para conhecer a sua sala de estar.

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